quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

ALÉM DO NIILISMO: EXISTENCIALISMO.


EXISTENCIALISMO

- Palavra central:

  • Liberdade

è Conferir observação de John Stott, segundo o qual esta deveria ser nossa palavra de ordem na evangelização.

  • E também significação.
  • Talvez não seja exagerado dizer que o existencialismo é uma filosofia que se rebela contra a indiferença com o homem no mundo moderno.
- Retomada do sentido das nossas aulas:

  • Defesa da fé – o cristianismo não é anti-intelectualismo. Tampouco é uma religião alienada e desinteressa da reflexão e da cultura – embora algumas expressões do cristianismo o tenham sido.
  • Mas se ganharmos debates, sem ganharmos os corações, de nada adiantará. É necessário demonstrar que há amor, liberdade e vida abundante em nosso cotidiano.
  • Intolerância e arrogância com feições algo diabólicas.
  • Queremos alcançar os corações e mentes. O Evangelho exige isso de nós.
- Muitas coisas roubam-nos a liberdade:

  • Sistemas políticas
  • Ortodoxia morta
  • Consumismo

è Não é difícil aqui conceder razão aos existencialistas.

Além do niilismo: existencialismo

- Epígrafe:

  • “Tudo o que existe nasce sem razão, prolonga sua existência, apesar da fragilidade, e morre por acaso. Reclinei-me e fechei meus olhos. As imagens, pressentidas, imediatamente saltaram e encheram meus olhos fechados com existências: existência é a plenitude que o homem jamais pode abandonar... Eu sabia que isso era o Mundo, o Mundo nu subitamente, revelando-se a si mesmo, e eu, calçado com raiva diante desse ser rude e absurdo.” (Sartre, Náusea)
- O existencialismo leva a sério o niilismo:

  • É uma resposta a ele. Busca transcendê-lo.
- Duas formas:

  • Existencialismo ateu – parasita do naturalismo
  • Existencialismo teísta – parasita do teísmo
- Alguns elementos presentes em Nietzsche:

  • O “super-homem”, além-do-homem (Übermensch)
  • Elogio da solidão e da aventura
  • Há muitos tópicos instigantes em sua filosofia
  • Embora a questão da liberdade nele seja muito complexa
  • Assim não se trata de um existencialista strictu sensu, mas de alguém que delineia temas que serão acolhidos pelos existencialistas
 - Um evento histórico importante para a compreensão desse movimento: a Primeira Guerra Mundial.

  • Após isso, nazismo – que se robustece na década de 30 –, quebra da bolsa etc.
  • Gera intensa frustração e desencanto cultural
- Em nossa época: vazio deixado pelo desaparecimento das utopias e da ditadura do consumo.

- Pinturas:

  • “O grito”, de Munch
  • “A chave dos campos”, de Magritte.
I. Existencialismo ateísta básico

- Aceita quase todas as proposições do naturalismo:

  • “A matéria existe para sempre
  • Deus não existe
  • O cosmo existe como uma uniformidade de causa e efeito, em um sistema fechado
  • A história é uma corrente linear de eventos conectados por causa e efeito, mas sem um propósito abrangente
  • A ética é relacionada apenas a seres humanos” (p. 144)
- Exceções:

  • Natureza humana
  • Modo como nos relacionamos com o cosmos (p. 144)

è “como podemos ser significantes num mundo insignificante” (p. 144) 

  1. O universo é composto apenas de matéria, porém para o ser humano a realidade se apresenta em duas formas – subjetiva e objetiva.

  • O mundo preexiste aos homens
  • “O mundo simplesmente existe” (p. 144)
  • Surgimento dos seres humanos:

a.    Distinguem ele e ela de isto

b.    “determinados a determinar o seu próprio destino, a questionar, a ponderar a maravilhar-se, a buscar sentido, a dotar o mundo exterior com um valor especial, a criar deuses.” (p. 144)

  • O mundo objetivo:

a.    Coisas materiais

b.    Lei inexorável de causa e efeito

c.    Ciência e lógica são aqui úteis

  • Mundo subjetivo:

a.    Mente, consciência

b.    Liberdade

c.    Ciência e lógica “não penetram esse domínio” (p. 145)

  • O naturalismo defendia a unidade dos dois mundos.
  • O existencialismo opera a disjunção dos dois mundos.
  • Podemos ter significado no mundo.

  1. Para os seres humanos a existência precede a essência; as pessoas fazem de si mesmas o que são.

  • Sartre: “Antes de tudo, o homem existe, cresce, surge em cena e, somente depois, é que se define.” (p. 147)
  • Mundo objetivo: tudo traz sua essência: sal é sal, mar é mar etc.
  • Mundo subjetivo:

a.    Os homens não são homens antes de se fazerem assim.

b.    Rosa: “Criatura gente é não e questão”

  • Exemplo do soldado que tem de tornar-se corajoso.

  1. Cada pessoa é totalmente livre com respeito à sua natureza e ao destino.

  • Temos soberania em nosso universo subjetivo.
  • Conferir Sartre, O existencialismo é um humanismo.
  • Conferir Sloterdijk sobre Sarte.

  1. O altamente elaborado e firmemente organizado mundo objetivo se coloca contra os seres humanos e parece absurdo.

  • O mundo objetivo se nos afigura absurdo.
  • “somos todos estrangeiros em uma terra estranha, e quanto mais cedo aprendermos a aceitar esse fato, tanto mais cedo transcendemos nossa alienação e superamos o desespero.” (p. 149)
  • O desafio da morte: o absurdo final. 

  1. No pleno reconhecimento e contra o absurdo do mundo objetivo, a pessoa autêntica deve revoltar-se e criar valores.

  • Enquanto seres conscientes, criamos valores.
  • “A pessoa que vive uma autêntica existência é aquela que se mantém cônscia da condição absurda do cosmo, mas que se rebela contra essa condição, criando significado.” (p. 150)
  • Dostoievski: “O significado da vida de um homem consiste em provar todo o tempo a si mesmo que ele é um homem, e não uma tecla de piano” (p. 151)
  • O mal é a passividade, a ausência de escolha. Por conseguinte, é o bem a escolha.
  • Semelhante diretiva é satisfatória? Que sentido teria o bem em semelhante argumentação?
  • Como julgar estes atos?

a.    Massacre de judeus pelos nazistas

b.    Massacre de palestinos por judeus

c.    Atentado terrorista aos EUA em 11/9/2001

d.    A destruição do Iraque pelos EUA

  • Como distinguir o moral do imoral? Como fazer sentido ao sentimento inato de que o outro tem direitos assim como eu? 

Um santo sem Deus

- Dostoievski, Irmãos Karamazovi:

  • “Se Deus está morto, tudo é permitido”
  • Não há santos, nem pecadores.
  • Não há moral, nem imoral.
  • Não há base para a ética.
- Albert Camus, A peste:

  • 1947.
  • Seu espaço é a cidade de Oran, na África do Norte.
  • Algumas personagens, entre as quais o Dr. Rieux e Jean Tarrou, buscam encetar ações boas em meio a um mundo absurdo.
  • Problema: a partir de que bases podemos julgar suas ações preferíveis às das outras personagens? 

Consegue o existencialismo transcender o niilismo?

- Divórcio realidade objetiva e subjetiva.

 - A questão da morte, à qual os existencialistas não concederam solução adequada.

  “O existencialismo ateísta vai além do niilismo apenas para alcançar o solipcismo, o eu solitário que existe por 87 anos (se não contrair a peste mais cedo), então cessa de existir. Muitos diriam que isso não é, de forma alguma, ir além do niilismo; significa apenas vestir uma máscara chamada valor, uma máscara despida pela morte.” (p. 160)

 II. Existencialismo teísta básico (20’)

- A resposta de Kierkegaard a uma ortodoxia fria e vazia – a conduzir ao niilismo teológico.

 - “Deus havia sido reduzido a Jesus que, por sua vez, foi reduzido a um homem puro e simples.” (p. 161)

 - Karl Barth, Emil Brunner e Reinhold Niebuhr:

  • Neo-ortodoxia.
- Em parte considerável das discussões teológicas, mormente em seus pontos mais polêmicos, falta amor, e sobra presunção e intolerância. Verdadeira obsessão (algo demoníaca) por heresia. O espírito da caça às bruxas ainda nos assombra. Não estranha que, a contrapelo do seu zelo por salva a pureza das doutrinas eclesiásticas, alguns cristãos assustem as pessoas, e findem por expulsá-las precisamente do Evangelho a que deveriam acolhê-las. Devemos ser exemplares na doutrina e também na acolhida amorosa.

 - Do teísmo, o existencialismo teísta aceita estas premissas:

  • “Deus é infinito e pessoal (trino).
  • É transcendente, imanente, onisciente, soberano e bom.
  • Deus criou o cosmo ex nihilo para operar com uma uniformidade de causa e efeito em um sistema aberto.
  • Os seres humanos são criados à imagem de Deus, assim podem conhecer algo de Deus e do cosmo e podem agir com significado.
  • Deus pode e se comunica conosco.
  • Nós fomos criados bons, mas agora somos decaídos e precisamos ser restaurados por Deus por meio de Cristo.
  • Para os seres humanos, a morte é ou o portão para a vida com Deus e seu povo ou para sempre separada de Deus.
  • A ética é transcendente e baseada no caráter de Deus.” (p. 161-2)
- Ênfase na natureza humana e em nossa relação com o cosmo e com Deus:

  1. Os seres humanos são seres pessoais que, quando chegam à plena consciência, descobrem-se em um universo hostil; se Deus existe ou não é uma questão difícil a ser resolvida, não pela razão, mas por meio da fé.
  • O existencialismo teísta não começa com Deus, mas com a escolha humana.
  • O caráter ambivalente do universo: ordem e, por vezes, ausência de sentido.
  • Amor e bondade, por vezes; e, não raro, violência.
  • Salto da fé – crer em Deus apesar do absurdo.
  • “cada pessoa, na solidão de sua própria subjetividade, envolta muito mais em trevas que em luz, deve escolher. E essa escolha deve ser um ato radical de fé.” (p. 164)

  1. O pessoal é que possui valor.

  • “os existencialistas teístas enfatizam o pessoal como valor primário.” (p. 166)
  • Conferir o quadro que se segue – contraste entre ortodoxia morta e existencialismo cristão:

 
Despersonalizado
Personalizado
Pecado
Quebrar uma regra
Trair um relacionamento
Arrependimento
Admitir a culpa
Tristeza quanto à traição pessoal
Perdão
Suspender a penalidade
Renovar a amizade
Crer em um conjto de proposições
Comprometer-se c. uma pessoa
Vida cristã
Obedecer às regras
Agradar ao Senhor, uma pessoa

 - Avaliação:

  • Possível reação dos teístas:

1.    A segunda coluna demanda a existência da primeira.

2.    O teísmo sempre incluiu a segunda coluna em seu sistema.

  • Problemas:

a.    Nem sempre o teísmo é bem compreendido.

b.    As igrejas não raro se concentram na primeira coluna.

  • “Isso levou o existencialismo a resgatar muitos teístas com respeito ao pleno reconhecimento da riqueza de seu próprio sistema.” (p. 167)
  • Necessidade de autocrítica – sob pena de recairmos numa presunção diabólica. Sentirmo-nos os campeões da ortodoxia.

  1. O conhecimento é subjetividade; a verdade total é com frequência, paradoxal.

  • A semelhante processo, pelos extremos a que conduz (pelagianismo ou hipercalvinismo), pode-se resistir quando assumimos que se somos criados à imagem de Deus, alguma parcela de verdade nos é dado conhecer.

  1. A história como registro de eventos é incerta, sem importância, mas a história como modelo, tipo ou mito a ser feito presente e vivenciado é de suprema importância.
  • A alta crítica do século XIX: desconfiança quanto à existência dos milagre – de que decorre afirmar-se a perda de credibilidade das Escrituras.
  • Em vez de então abandonarem a fé cristã, passam a tomar a narrativa bíblica enquanto instância que proveria modelos morais de comportamento.
  • “Os fatos registrados no texto bíblico não eram importantes, mas os seus exemplos de um bom viver e suas imortais verdades morais é que o eram.” (p. 172)
  • “Dizia-se sobre a queda que ela não teria ocorrido lá atrás, no tempo e espaço, mas cada pessoa reproduz essa hipótese em sua própria vida.” (p. 174)
  • Boa crítica de Lloyd Geering, em Resurrection: a symbol of hope: “Como pode um não evento [a ressurreição que não aconteceu] ser considerado um símbolo de esperança ou, na verdade, de qualquer outra coisa? Se algo aconteceu, tentamos ver o que significa. Se não aconteceu, a questão não pode ser suscitada. Somos levados de volta para a necessidade de um evento Pascal.” (p. 175)
  • “Deve haver um evento para se haver propósito.” (p. 175)
è Não necessariamente. Os mitos nutrem-se dessa relação não obrigatoriamente simétrica com o plano da faticidade.


- Não tenho dificuldade em acolher diversos elementos do existencialismo. Mas é necessário esclarecer-se os limites dessa cosmovisão, bem como suas consequências nada animadoras.

Um comentário:

  1. Muito bom o resumo, mas fica a dica para os próximos artigos, citar a obra e seu respectivo autor. Vi que usou James W. Sire - O universo ao lado

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